sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Semana da Consciencia Negra


Besouro

                Por Ana Lucia Santana

Em uma época na qual os negros ainda não tinham conquistado sua liberdade, embora formalmente fossem considerados livres, alguns ex-escravos encontraram um caminho para lutar pelos seus direitos, uma estranha coreografia que mesclava luta e dança, conhecida como Capoeira. É neste cenário que surge um dos heróis mais lendários do Brasil, Besouro.

Nascido na Bahia, este símbolo do movimento negro logo se tornou um mito quando as pessoas, incapazes de explicar de outra forma suas constantes vitórias contra os policiais e as autoridades constituídas, passaram a atribuir este sucesso ao seu dom de voar. Manoel Henrique Pereira se transformou então no invencível Besouro.

Esse enigmático personagem da história brasileira veio ao mundo em 1897, oito anos depois da libertação legal dos escravos, em Santo Amaro da Purificação, cidade localizada no Recôncavo Baiano. Seus pais, João Grosso e Maria Haifa, eram ex-escravos.

Embora portadores do status de pessoas libertas, os negros não eram exatamente tratados como membros da sociedade. Na verdade eles faziam parte de uma massa informe, desprovida dos direitos mais elementares, como moradia, alimentação e trabalho.

Mergulhados neste contexto marginal, os ex-escravos praticamente perpetuam sua antiga condição, particularmente no campo, sob as garras dos mesmos fazendeiros e senhores de engenho que tanto se beneficiaram na época da escravidão. É este cenário que Manoel encontra ao nascer no interior da Bahia.

Aos vinte anos ele já é chamado de Besouro Mangangá, ou Besouro Cordão de Ouro. Analfabeto, ele já era um capoeirista de renome, a quem ninguém conseguia superar nesta luta. Apesar de ser um bravo guerreiro, ele também se submetia às condições de trabalho impostas pelos fazendeiros de sua terra, labutando arduamente na lavoura de cana. Só que o destemido negro não temia seus opressores, e não era preciso muito para que ele se rebelasse, o que contribuiu para a construção de sua fama.

Pouco se sabe sobre os caminhos que ele percorreu, mas não é difícil imaginar que suas atitudes tenham despertado a ira dos dirigentes daqueles tempos, os quais provavelmente o viam como um perigoso insurgente. As histórias lendárias que circulam sobre este personagem descrevem combates épicos com o corpo policial de então, dos quais Besouro sempre era o vencedor. Alguns diziam que ele tinha o ‘corpo fechado’, pois nem mesmo as balas o atingiam.

Seu apelido, Mangangá, explica miticamente sua incrível capacidade de fugir dos seus adversários – ele se refere a uma espécie de besouro que provoca uma contundente ferroada. Ou seja, o lutador derrotava o inimigo e logo após desaparecia sem deixar vestígios. Diz a lenda que ele simplesmente saía voando.

Sua morte também está envolta em mistério. Afirma-se que, depois de um confronto com servidores de uma fazenda, ele teria levado uma facada; acrescentam os mitos que a faca seria confeccionada com uma madeira ilustre chamada de ticum, única arma com poderes para transpassar uma pessoa que tinha o ‘corpo fechado’, de acordo com o universo religioso afro-brasileiro. Conforme a versão oficial, ele foi morto em uma armadilha organizada pelo filho de um fazendeiro.

Besouro está de volta, mais forte do que nunca, comprovando sua imortalidade como símbolo da cultura negra brasileira. Este mito foi resgatado pelo cineasta João Daniel Tikhomiroff, que por sua vez se inspirou na obra Feijoada no Paraíso, de Marco Carvalho. Ele procura resgatar esta história não como um filme documental, mas sim como uma mistura de ficção e fantasia.

A produção promete e acena com a possibilidade de uma indicação para a categoria de Melhor Filme Estrangeiro no Oscar. Mas seu maior mérito é tirar das sombras do esquecimento este fantástico personagem histórico, interpretado por Ailton Carmo.



 Onde sonham as formigas verdes
 

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

XI SEMANA DE LETRAS




Palavra [En]cantada: um filme de Helena Solberg
Por Priscila Santos

Para alguns estudiosos e observadores da literatura, a poesia se caracteriza por uma criação artística que existe sozinha: tem suas regras, suas formas, seus sons próprios e estes a fazem plena unicamente em si, podendo dispensar acompanhamentos. É comum que numa roda, reunindo esses mesmos estudiosos e observadores da literatura, lá pelas tantas, pelo quarto copo de vinho, alguém declare a sentença: Chico Buarque, por exemplo, não é poeta, é músico. A partir daí a conversa, antes consenso, vai virar uma discussão sem fim e depois de meses, dois ou três daqueles amantes das letras ainda estarão se odiando mortalmente. Fatalmente vão produzir alguns tratados que não nos tocarão em nada.
Palavra [En]cantada é um filme que ronda o mistério das palavras ditas e entoadas sem chegar perto desse tipo de debate onde um bom e velho veneno da vaidade academicista sempre mata um pouco mais a gente. Dirigido por Helena Solberg, com argumento de Marcio Debellian, o documentário segue uma reflexão a respeito dos momentos em que música brasileira e poesia convergiram.
Através do depoimento de grandes nomes da música nacional, Sodenberg nos leva a fogo brando pela história e escolas da música brasileira; dos morros cariocas à periferia de São Paulo, passando pela Bahia e pelo mangue pernambucano. O documentário parte da idílica existência dos trovadores, aqueles artistas medievais que inventaram a poesia musicada e a espalharam de tal forma que são considerados o marco zero da literatura como hoje a conhecemos. A partir daí nomes como Tom Zé, Lenine, Maria Betânia, Martinho da Vila, Lirinha do Cordel do Fogo Encantado, BNegão e o próprio Chico Buarque, vão falar sobre a presença da poesia em suas canções e dão versões sobre o porque e do como esses encontros acontecem.
O filme traz ainda imagens de arquivo recuperadas, algumas nunca vistas, como as de carnavais na Avenida Presidente Vargas, no Rio de Janeiro e encenações de Morte e Vida Severina pelo grupo de teatro da PUC (o primeiro a montar a peça, em 1965), além de raridades como a entrevista de Caetano Veloso, falando sobre porque combinou na sua música Coca-Cola e Brigite Bardot, e apresentações de repentistas do Nordeste em meados do século passado.
Na junção de todos os seus segundos e coisas ditas, Palavra [En]cantada nos faz descobrir muito mais sobre música, poesia e brasilidade do que muitos foram capazes de fazer. A contribuição é enorme: enfrentar a particularidade do caso nacional, onde a palavra escrita não conseguiu até hoje criar raízes fortes e onde a literatura só pôde se expandir através da oralidade - o que nos torna indivisíveis da maior parte da África - e abre um novo leque de possibilidades para entendermos a absurda riqueza de formas e sons da nossa língua e da nossa música. Solberg e Debellian pariram um filme essencial para quem ainda acredita que a beleza salvará o mundo.



domingo, 31 de outubro de 2010

O grande Ditador


O Grande Ditador

Por Rodrigo Cunha

"Apenas um gênio consegue fazer uma sátira em plena guerra, sem ofender e com cenas realmente engraçadas no conteúdo "

Charles Chaplin é um gênio. Isso é um fato que não há como discutir, que foi construído ao longo dos anos, conforme seus filmes iam sendo produzidos. É praticamente impossível que, uma pessoa que assista TV ou veja filmes, não o conheça, mesmo que indiretamente. Chaves, por exemplo, a famosa série de TV da vila e de pessoas atrapalhadas, é inteiramente baseada nas obras de Chaplin, inclusive com algumas cenas e falas retiradas de seus filmes. Como um bom amante de Cinema, não poderia deixar de comentar uma de suas maiores obras, talvez a que eu mais goste, talvez a mais crítica, com certeza a mais política de todas: O Grande Ditador.

O filme foi o primeiro a ter uma cópia restaurada e redistribuída autorizada pela família do ator, escritor e diretor (sim, Chaplin era isso tudo em seus filmes, e sempre brilhante), o que nos faz duvidar da legalidade e qualidade desses DVD´s que rondam as bancas brasileiras (se bem que eles ajudam, e muito, as pessoas a conhecerem as obras de Chaplin). Apesar de ter sido produzido em 1940 (13 anos após a estréia do som no Cinema), este foi apenas o primeiro filme totalmente falado de Carlitos. Antes disso, ele havia aberto sua boca (e mesmo assim não para falar) somente em Tempos Modernos (outro clássico), na cena em que ele canta de improviso para um bar lotado. Chaplin sempre acreditou que o som tiraria o expressionismo, o que, hoje em dia, realmente aconteceu.

Demorou, mas ele abriu a boca. A história aqui é em meio a Segunda Grande Guerra Mundial, onde os judeus estavam sendo esmagados pelo preconceito alemão. Chaplin, genialmente, interpreta os dois protagonistas da história: o ditador Adenoid Hynkel (em clara referência à Hitler) e o barbeiro Judeu. Irônico e atrevido, logo no início da projeção lemos uma mensagem que diz que qualquer semelhança dos personagens com a realidade é mera coincidência. Só que essa ousadia lhe rendeu alguns efeitos colaterais, como ter sido expulso dos EUA. Tudo devido a esta sátira em meio ao apogeu do criticado, coragem sem igual na época.

Durante suas duas horas e cinco minutos de produção (sem nunca ficar cansativo ou chato!), o filme é inteiramente feito de cenas clássicas do Cinema, sendo que a maior delas, sem sombra de dúvidas, é a que Hynkel brinca com o globo do mundo. Uma cena sempre imitada, jamais igualada. Seus movimentos, o significado, ela é inteiramente encantadora. Outra cena extremamente engraçada é o discurso alemão, sendo que nenhuma palavra sequer pode ser entendida. O esbravejamento, a calma, tudo é perfeitamente compreensível somente pelos movimentos.

O ditador alemão também divide hilárias situações com o outro ditador, Napoloni (satirizando Mussolini), onde os dois ficam em uma constante disputa de ego. A cena da barbearia, onde os dois ficam subindo as cadeiras para que o outro olhe para cima, e a briga de comida são críticas fortíssimas empregadas de maneira inteligente e extremamente divertidas. Este também foi o último filme de Chaplin com sua ex-mulher Goddard, assim como o último que teve presença do bigodinho.

O filme foi indicado para o Oscar nas categorias de melhor filme, ator, roteiro, ator coadjuvante e trilha sonora. Isso é, no mínimo, irônico. Expulso e consagrado, no mesmo lugar, na mesma época. Aqui ele realmente tinha algo a dizer com suas palavras. O discurso final, englobando tudo o que havia criticado durante o filme, é emocionante. A cegueira das pessoas também é criticada nessa cena. Como todas aquelas pessoas, que se dizem fiel, conseguiram confundir seu maior ídolo com um simples judeu com suas roupas? E as condecorações? Será que os militares não teriam percebido?

O filme é também menos engraçado do que os tradicionais, reservando-se mais em contar a história em certos momentos. Apesar desse fato e das cenas já comentadas, algumas outras não são menos engraçadas: o vôo de cabeça para baixo do avião, o judeu tentando controlar o canhão, o judeu fazendo a barba ao som de uma famosa ópera. Enfim, o filme é Chaplin, apenas com uma história mais séria para se contar.

O Grande Ditador é um dos melhores filmes que eu já vi, sem sombra de dúvidas. Esteja preparado para todas aquelas piadas ‘bobas’ que você está acostumado principalmente se assistir Chaves, pois foi tudo originado aqui. Só que, ao mesmo tempo, há excelentes sacadas e um tom extremamente irônico a diversos acontecimentos sérios satirizados. Indispensável, aconselho até aqueles que não gostam de filmes antigos por seu charme e poder de encantar a todos que estiverem assistindo.

Fonte: http://www.cineplayers.com/critica.php?id=254 Trailer

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O último discurso

de “O Grande Ditador”

“ Sinto muito, mas não pretendo ser um imperador. Não é esse o meu ofício. Não pretendo governar ou conquistar quem quer que seja. Gostaria de ajudar – se possível – judeus, o gentio... negros... brancos. Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Os seres humanos são assim. Desejamos viver para a felicidade do próximo – não para o seu infortúnio. Por que havemos de odiar e desprezar uns aos outros? Neste mundo há espaço para todos. A terra, que é boa e rica, pode prover a todas as nossas necessidades.

O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça envenenou a alma dos homens... levantou no mundo as muralhas do ódio... e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.

A aviação e o rádio aproximaram-nos muito mais. A própria natureza dessas coisas é um apelo eloqüente à bondade do homem... um apelo à fraternidade universal... à união de todos nós. Neste mesmo instante a minha voz chega a milhares de pessoas pelo mundo afora... milhões de desesperados, homens, mulheres, criancinhas... vítimas de um sistema que tortura seres humanos e encarcera inocentes. Aos que me podem ouvir eu digo: “Não desespereis! A desgraça que tem caído sobre nós não é mais do que o produto da cobiça em agonia... da amargura de homens que temem o avanço do progresso humano.

Os homens que odeiam desaparecerão, os ditadores sucumbem e o poder que do povo arrebataram há de retornar ao povo. E assim, enquanto morrem homens, a liberdade nunca perecerá.Soldados! Não vos entregueis a esses brutais... que vos desprezam... que vos escravizam... que arregimentam as vossas vidas... que ditam os vossos atos, as vossas idéias e os vossos sentimentos! Que vos fazem marchar no mesmo passo, que vos submetem a uma alimentação regrada, que vos tratam como gado humano e que vos utilizam como bucha de canhão! Não sois máquina! Homens é que sois! E com o amor da humanidade em vossas almas! Não odieis! Só odeiam os que não se fazem amar... os que não se fazem amar e os inumanos!

Soldados! Não batalheis pela escravidão! Lutai pela liberdade! No décimo sétimo capítulo de São Lucas está escrito que o Reino de Deus está dentro do homem – não de um só homem ou grupo de homens, ms dos homens todos! Está em vós! Vós, o povo, tendes o poder – o poder de criar máquinas. O poder de criar felicidade! Vós, o povo, tendes o poder de tornar esta vida livre e bela... de faze-la uma aventura maravilhosa. Portanto – em nome da democracia – usemos desse poder, unamo-nos todos nós. Lutemos por um mundo novo... um mundo bom que a todos assegure o ensejo de trabalho, que dê futuro à mocidade e segurança à velhice.É pela promessa de tais coisas que desalmados têm subido ao poder.

Mas, só mistificam! Não cumprem o que prometem. Jamais o cumprirão! Os ditadores liberam-se, porém escravizam o povo. Lutemos agora para libertar o mundo, abater as fronteiras nacionais, dar fim à ganância, ao ódio e à prepotência. Lutemos por um mundo de razão, um mundo em que a ciência e o progresso conduzam à ventura de todos nós. Soldados, em nome da democracia, unamo-nos!Hannah, estás me ouvindo? Onde te encontrares, levanta os olhos! Vês, Hannah? O sol vai rompendo as nuvens que se dispersam! Estamos saindo da treva para a luz! Vamos entrando num mundo novo – um mundo melhor, em que os homens estarão acima da cobiça, do ódio e da brutalidade. Ergue os olhos, Hannah! A alma do homem ganhou asas e afinal começa a voar. Voa para o arco-íris, para a luz da esperança. Ergue os olhos, Hannah! Ergue os olhos!"

Fonte : http://abismopoeticoecia.blogspot.com/2009_03_01_archive.html

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Arquitetura da Destruição



Este filme é considerado um dos melhores estudos sobre o Nazismo. Lembra que chamar Hitler de artista medíocre não elimina os estragos causados por sua estratégia de conquista universal. O arquiteto da destruição tinha grandes pretensões e queria dar uma dimensão absoluta à sua megalomania. O nazismo tinha como princípio fundamental embelezar o mundo, nem que para isso tivesse que destruí-lo.

Esse documentário traça a trajetória de Hitler e de alguns de seus mais próximos colaboradores, com a arte. Muito antes de chegar ao poder, o líder nazista sonhou em tornar-se artista, tendo produzido várias gravuras, que posteriormente foram utilizadas como modelo em obras arquitetônicas. Destaca ainda a importância da arte na propaganda, que por sua vez teve papel fundamental no desenvolvimento do nazismo em toda a Alemanha.


Numa época de grave crise, no período entre guerras, a arte moderna foi apresentada como degenerada, relacionada ao bolchevismo e aos judeus. Para os nazistas, as obras modernas distorciam o valor humano e na verdade representavam as deformações genéticas existentes na sociedade; em oposição defende o ideal de beleza como sinônimo de saúde e consequentemente com a eliminação de todas as doenças que pudessem deformar o "corpo" do povo. Nasce assim uma "medicina nazista" que valoriza o corpo, o belo e estará disposta a erradicar os males que possam afetar essa obra.

Do ponto de vista social, o embelezamento é vinculado diretamente à limpeza. A limpeza do local de trabalho e a limpeza do próprio trabalhador. Os nazistas consideram que ao garantir ao trabalhador a saúde e a limpeza, libertam-no de sua condição proletária e, garantem-lhe dignidade de burguês, eliminando portanto a luta de classes.


A Guerra é vista como uma arte. Com cenas de época, oficiais, mostra-nos a visita de Hitler à Paris logo após a ocupação: O Fuher chega de avião durante a madrugada, visita a Ópera, o Arco do Triunfo, alguns prédios imponentes. Volta para a Alemanha no mesmo dia. O domínio sobre a França, Bélgica, Holanda possibilitaram aos nazistas a pilhagem de obras de arte. Em 1941 a conquista da Grécia; nova viagem de Hitler, que tinha na beleza da antigüidade um de seus modelos.

O filme dedica ainda um bom tempo à perseguição e eliminação dos judeus como parte do processo de purificação, não só da raça, mas de toda a cultura, mostrando o processo de extermínio. É interessante perceber que, durante toda a guerra, mesmo no período final com a proximidade da derrota, os projetos arquitetônicos do III Reich tiveram andamento, pretendendo construir a nova Berlim, capital do mundo.


Trailer



Após o filme haverá discussões coordenadas pela Profª. Draª. Maria do Rosário  F. Valencise Gregolin. ( Departamento de Linguística/  UNESP FCLAR)

Serão emitidos certificados.

sábado, 16 de outubro de 2010

Semana de Ciencia e Tecnologia

Metrópolis

Por Deivid Cardoso

Obra-prima à frente do seu tempo. Continua atual. Muitas décadas antes dos irmãos Wachowski nos presentearem com a baboseira pseudo-filosófica de Matrix Reloaded e Matrix Revolutions (não citarei o original de 1999, pois ainda o acho um marco na história do cinema, embora a premissa não tenha sido bem aproveitada), um verdadeiro gênio do cinema - Fritz Lang (autor do também excepcional M - O Vampiro de Dusseldorf), já nos brindava com a sua visão bem mais realista do que poderia vir a ser o futuro da humanidade.

Sempre reverenciado e imitado por vários cineastas, inclusive os mais importantes da História, Lang traçou um perfil de como ele imaginava um futuro (baseada na novela escrita por Thea von Harbou, que também escreveu o roteiro em parceria com Lang) onde haveria uma classe dominante (os ricos) e uma classe dominada (os operários), que viviam em suas cidades no subsolo, onde trabalhavam diuturnamente, em períodos divididos de 10 horas cada, para não deixarem que a cidade onde os mais ricos moravam parasse. Ou seja: estamos em um futuro distante e o mundo está sob o comando dos poderosos, que isolaram os mais pobres no subsolo como se fossem seus escravos, para que trabalhassem em prol dos mesmos.

Comandados por Freder Fredersen (Gustav Fröhlich), os operários são obrigados a trabalharem sem parar para que a cidade não pare. Um dia, após achar planos de uma possível rebelião nas roupas de um operário que havia morrido em um acidente, o filho de Fredersen, Johhan Fredersen (Alfred Abel), decidiu descer até a cidade dos operários, lá vendo quão desumano era o tratamento que eles sofriam - cena memorável a que ele fica exausto tendo de trabalhar em uma máquina com ponteiros, não vendo a hora em que as suas 10 horas de turno terminassem.

E é naquele local horroroso que ele encontra a bela Maria, que em uma das reuniões à qual ele comparece como se fosse um trabalhador comum, vê que os planos da rebelião estão mesmo sendo levados adiante. Mas, ao contrário de que pensavam, eles querem que tudo seja feito na paz, e esperam que um mediador os ajude a fazer isso. Mas os planos deles não dão muito certo, pois Freder Frederson pede ajuda a um cientista de sua confiança (interpretado por Rudolf Klein-Rogge), que está trabalhando na construção de um robô que será capaz de substituir os humanos no trabalho. E ele seqüestra Maria, substituindo-a pelo robô, infiltrando-o no meio dos operários para tentar causar a discórdia e a própria destruição dos mesmos, mostrando assim que estes não merecem o respeito que exigem.

Assim como na saga futurista dos irmãos Wachowski, os operários são levados a acreditar que um dia virá alguém que os libertará de todo esse sofrimento e angústia. No caso, O Mediador. Mas aqui a espera deles têm algum fundamento, pois liderados por Maria (interpretada por Brigitte Helm, que também faz o papel do robô que toma o lugar dela), eles acreditam que "não pode haver entendimento entre a mão e o cérebro se o coração não agir como mediador" (sentença hoje célebre no mundo do cinema). E é por esse coração que todos aguardam. Como podemos ver, em sua visão do futuro, o diretor não estava tão errado, pois hoje em dia já acontece algo parecido: os trabalhadores têm que fazer com que o país não pare, enquanto que a classe mais poderosa somente desfruta de todas as regalias às custas de quem trabalha incessantemente.

Com uma bela história e um jeito único de contá-la, Fritz Lang nos mostra que não é preciso encher um filme de efeitos especiais (embora estes também foram necessários para criar um visual revolucionário para a época) e lances futuristas que sabemos ser difícil de que venham a acontecer para se fazer um bom filme de ficção. Imitado por várias gerações posteriores, Lang tinha uma particularidade que anos após veio a ser copiada pelo maior mestre do suspense. Após ter de ensinar a um ator como deveria fazer com a mão em um close, o diretor acabou gostando do take e utilizando-o no filme original. A partir daí, ele optou por colocar em todos os seus filmes um close de sua própria mão. Alfred Hitchcock o imitou aparecendo em todas as suas películas. E hoje em dia M. Night Shyamalan faz a mesma coisa. O que é bom tem de ser copiado mesmo.

O filme original, feito em 1927 (portanto, mudo), tinha mais de cinco horas de duração. Mas com o passar dos anos, ele foi sendo enxuto, até que chegasse hoje em dia com a sua versão de um pouco mais de duas horas de projeção. Com tantos filmes ruins sendo refilmados, os executivos de Hollywood deveriam tentar recontar essa história, com os recursos que dispõem hoje. Se derem sorte de pegar um bom diretor, teremos uma ótima história nas telas. Se você se acha entendedor de filmes, esse é indispensável

Fonte:http://www.cineplayers.com/critica.php?id=168

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O Planeta dos Macacos

por Kollision

Em qualquer lista hipotética de grandes fantasias da história do cinema, O Planeta dos Macacos merece figurar com certeza em posição de destaque. Ainda numa época em que a ameaça da aniquilação nuclear era uma realidade não muito distante graças à paranóia da Guerra Fria, a idéia de apresentar uma sociedade em que os seres humanos não estavam no topo da cadeia alimentar, num filme com tamanha escala de produção e considerável esmero técnico, era uma iniciativa que nunca havia sido tomada antes. O inevitável sucesso da obra, baseada no livro de Pierre Boulle e co-escrita por Rod Serling, a mente por trás do seriado Além da Imaginação, viria a gerar quatro continuações, compondo uma das primeiras grandes sagas de ficção científica da sétima arte.

600 anos no nosso futuro, o astronauta Taylor (Charlton Heston) grava o último registro de bordo em sua nave antes de entrar em animação suspensa com mais três companheiros. O destino de sua expedição, no entanto, só é alcançado 2000 anos no futuro, quando a nave sofre uma pane e aterrisa numa área alagada de um planeta estranho. Uma de suas colegas astronautas já está morta, e ele e os outros dois são obrigados a sobreviver num ambiente árido e inóspito. O que eles logo descobrem é que o planeta é habitado e governado por uma raça de símios evoluídos que falam inglês e caçam os humanos (que não falam) como animais selvagens. Capturado e impedido de falar graças a um ferimento na garganta, Taylor se torna o objeto de estudo da dra. Zira (Kim Hunter) e do arqueólogo Cornelius (Roddy McDowall), cujas pesquisas avançadas em psicologia humana são monitoradas de perto pelo implacável chefe da tribo macaco, o dr. Zaius (Maurice Evans).

O escapismo orquestrado pelo diretor Franklin Schaffner é sublinhado por um design de produção que aproveita ao máximo as paisagens naturais utilizadas no início e no final do filme, assim como a excepcional trilha sonora carregada de suspense de Jerry Goldsmith. Como aventura de ficção científica, este filme é páreo duro para qualquer blockbuster de ação de qualquer época. A cena do "estouro da boiada" e da caçada aos humanos fugitivos na mata, por exemplo, ainda impressiona pela escala e pelo tom de desconforto. Há uma combinação acertada de perseguições e suspense e, o que é mais marcante, uma discussão extremamente apropriada sobre evolução, religião, ciência, autoritarismo e preconceito, refletidos na sociedade símia com um espelhamento nada menos que incômodo em relação à sociedade humana.

Impedindo que o filme fosse rotulado de mais uma ficção classe B, a presença de Charlton Heston no elenco trouxe uma credibilidade indispensável ao longa, já que os demais nomes do elenco passam o tempo todo debaixo de pesadas máscaras e roupas de macaco. Outra característica bacana do filme é seu senso de humor, às vezes completamente não-intencional, como nas duas cenas em que Roddy McDowall e Kim Hunter trocam beijinhos debaixo da maquiagem de macaco. Para a época, o trabalho de caracterização dos atores em macacos foi considerado vanguarda absoluta e foi agraciado com um Oscar especial, uma vez que não havia categoria estabelecida para a técnica de maquiagem.

Este filme foi refilmado e atualizado por Tim Burton em 2001. Embora as duas versões sejam ótimas em seus próprios termos, O Planeta dos Macacos original é o grande clássico que marcou o gênero. A continuação da história está em De Volta ao Planeta dos Macacos (Ted Post, 1970). Os extras da edição simples do DVD da Fox se resumem a uma galeria de fotos e desenhos de produção e aos trailers dos cinco filmes da série.

Fonte: http://www.kollision.biz/movies/mov_file/mov_planetoftheapes1968.htm

Trailer

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

1ª Mostra Audiovisual do Campus


1ª Mostra Audiovisual do Campus

 Os membros do projeto de extensão Cine Campus convidam todos os alunos, professores e funcionários da UNESP- FCLAR a participarem da 1a Mostra Audiovisual do Campus.
O período de inscrição será de 27/09/2010 a 01/11/2010.
Dúvidas, cine_campusar@yahoo.com.br
Para participar, é preciso entregar a ficha de inscrição preenchida e o filme/ média/curta ou minuto (gravado em DVD ou CD) para exibição.


1      - Inscrições:

1.1  – A Primeira Mostra Audiovisual tem como objetivo divulgar a produção audiovisual de indivíduos que estejam ligados a UNESP – FCLAr. Sendo assim, a seleção será feita com o único critério de que funcionários, alunos e professores tenham exercido qualquer tipo de função dentro de uma produção audiovisual.
1.2  A Mostra não é um concurso, portanto, toda produção enviada será exibida (desde que esteja de acordo com o item 1.1), já que o intuito da Mostra é a divulgação dos trabalhos da comunidade da FCLAr.
1.3 - Será aceita apenas uma produção audiovisual por inscrição.
1.4 – A ficha de inscrição está disponível no site: www.cinecampusararaquara.blogspot.com .
1.5 - As inscrições serão efetuadas pessoalmente e será necessário levar o DVD (ou CD) com sua produção para o Cine Campus toda terça-feira e quinta-feira (de acordo com o período de inscrição) no Anf. B das 16h00 às 18h30.
1.6 - O vídeo deve ser gravado em CD ou DVD, no formato avi, que deverá ser entregue juntamente com a ficha de inscrição devidamente preenchida.

 2      – Exibição:

2.1 - A exibição será feita a partir das 14h00, no Anfiteatro B, nos dias 16 e 18 de novembro de 2010.
2.2 - Posteriormente os vídeos serão compilados, gravados em DVD e entregues à biblioteca para a posteridade. Para isso o participante, que estiver de acordo, deve preencher o termo de direitos autorais.

Para maiores informações acesse o Blog do Projeto: www.cinecampusararaquara.blogspot.com

 Atenciosamente,
 CINE CAMPUS

 A ficha de inscrição deve ser copiada e colada no word, preenchida, impressa e entregue conforme mencionado acima:


1ª Mostra Audiovisual do Campus

Ficha de Inscrição


Nome completo:_________________________________________________
Idade:______________
Sexo: Feminino ( ) Masculino ( )
Função exercida na obra audiovisual: ________________________________
Produção audiovisual:____________________________________________
Longa ( ) Média ( ) Curta ( ) Minuto ( )
Tempo de duração: ______________________________________________
Título da produção:______________________________________________
Ficha técnica com sinopse:_______________________________________

É aluno da FCL? Se sim, qual curso? ________________________________
É funcionário da FCL? Se sim, o que faz?____________________________
É professor da FCL? Se sim, qual área? Qual Departamento?_____________
E-mail para contato:_____________________________________________


TERMO DE AUTORIZAÇÃO

 Pelo presente instrumento, ______________________________________________________,
abaixo firmado e identificado, autoriza, graciosamente, o CINE CAMPUS,
projeto de extensão sem fins lucrativos da Unesp de Araraquara, a realizar
réplica, exibição e divulgação da produção audiovisual
___________________________ a ser veiculada, sem objetivo comercial, na
1ª Mostra Audiovisual do Campus e, posteriormente, em compilação das
exibições, destinada ao arquivo da Biblioteca da FCLAr.
Esta autorização inclui portanto a exibição e documentação do evento,
conforme expresso na Lei 9.610/98 (Lei de Direitos Autorais).


                                             Araraquara, _____ de ________________ 2010.

 Assinatura:________________________________________
 
Nome: ____________________________________________
End.: _____________________________________________
CPF: _____________________________________________



sábado, 18 de setembro de 2010

Ciclo de Filmes comentados: Ingmar Bergman



O Sétimo Selo de Bergman

Por Breno Rodrigues de Paula

Na maioria das vezes, o Artista conjuga o seu nome junto com a sua obra, de modo que ele torna-se sinônimo de sua criação. É o que acontece com os cineastas sueco Ingmar Bergman. Não conseguimos dissociar filmes tais como: “Monika e o desejo” (Sommaren med Monika) – 1952, “O sétimo selo” (Det sjunde inseglet) – 1956, “Morangos silvestres” (Smultronstallet) – 1957, “Gritos e sussurros” (Viskningar och rop) – 1972, “Sonata de outono” (Höstsonaten) do nome Bergman. Bergman foi um gênio que se dedicou à produzir belos filmes, como um dos mais importante, não só de Bergman, mas também da Sétima Arte: “O Sétimo Selo”.

Poucas obras artísticas, criada pelo homem, na sua eterna e incessante busca pelo conhecimento do mundo e de si próprio, retratam de forma tão poética e profunda os anseios do homem na busca da sua constituição metafísica como o filme de Bergman “O sétimo selo” (Detsjunde inseglet) – 1956. No filme, após dez anos, um cavaleiro Antonius Block (Max Von Sydow) retorna das Cruzadas e encontra o seu país (Suécia) devastado pela peste negra. Sua fé em Deus é sensivelmente abalada e enquanto reflete sobre o significado da vida, a Morte (Bengt Ekerot) surge à sua frente querendo levá-lo, pois chegou sua hora. Objetivando ganhar tempo, convida-a para um jogo de xadrez que decidirá se ele parte com a Morte ou não. Tudo depende da sua vitória no jogo e a Morte concorda com o desafio, já que não perde nunca. Aqui a morte é o cerne da questão levantada por Bergman. A principal questão metafísica humana: seria a morte a principal manifestação empírica da realidade ou a mera condição que o homem está sujeito aos caprichos divinos de Deus, do Diabo ou da Morte. Estas questões, inserem-se, no filme, numa conjuntura caótica e angustiante para o cavaleiro e seu escudeiro.

A cena do jogo de xadrez com a Morte, mostra-se de beleza estética cinematográfica única na sétima arte. Após acordar na praia, o cavaleiro lava o seu rosto e reza baixinho, ao virar a sua face para trás, ele defronta-se com a figura da Morte. Assustado e com medo, o cavaleiro pergunta se a Morte gostaria de jogar xadrez, já que lerá que todos jogam xadrez, inclusive a Morte. A morte acha que isto é uma artimanha do cavaleiro para que não seja “levado”, mas concorda em iniciar a partida. O interessante que a Morte não é retratada como a irmã mais velha dos “perpétuos” ou como uma entidade monstruosa, na acepção física, ela se aprece com um homem e se veste como um monge. Nos intervalos dos lances, o cavaleiro e seu escudeiro andam pela vila e presenciam diversos acontecimentos como a morte de uma feiticeira, que supostamente havia mantido relações sexuais com o demônio, na fogueira. Conhecem uma trupe de artista e conhece Mia e Jof, que lhe dão morangos e leite, como num ritual semelhante à “Santa Ceia”.

Prossegue a partida de xadrez e o cavaleiro leva xeque – mate da Morte, que o informa que ele será levado na manhã seguinte. A Morte iniciou o jogo sabendo que ninguém pode vencê-la. Mesmo com táticas e estratégias do xadrez, o cavaleiro não pode vencer a morte. Todos dançam, ao final, a sua música, todos de mãos dadas. Todos sobem a colina ritmicamente fazem passos coordenados, cíclicos. Mas o silêncio da abertura do sétimo é quebrado pela dança da morte, que com a sua música, assim como o Flautista de Hamelin, leva os homens a conhecer a sua mais complexa realidade: a existência humana.

Bergman retratara o homem frente às questões tais como a morte, Deus, Diabo, efemeridade da vida, solidão, alienação. Em suma, retratara o homem na busca da transcendência da sua condição meramente humana, através da única forma que o homem tem para transcendê-la: a Arte. 



 


Fanny e Alexander
AS MÁSCARAS DE BERGMAN

Os amantes do cinema clássico americano, de décadas anteriores aos anos 1950, refugiam-se em filmes de aventura e romance justamente para esquecer que existem os problemas internos e alguns eventuais desequilíbrios atribuídos a seres humanos. Pareciam, mesmo enquanto alegravam platéias, produtos guiados pela lógica do gênero aos quais serviam. Como esperar de Keaton ou de Astaire alguma leitura freudiana sobre os freqüentes conflitos sexuais presentes nas pessoas? Os personagens da ficção promovida pelo cinema de massa, portanto, quase sempre estavam longe de determinados temas presentes em trabalhos de outros cineastas. O círculo de arte, ou mesmo o tempo – e depois a redescoberta –, eram o refúgio de alguns artistas com temas "pouco agradáveis". No cinema clássico americano, em grande parte dos filmes os personagens pouco demonstravam crises existenciais. Viviam de acordo com as regras básicas da aventura, romance, drama e, às vezes, de algum mundo mágico onde intenções sexuais e medos internos ainda não haviam chegado. Menos ainda, tinham seus interiores expostos como fora observado mais tarde, de forma visceral por alguns cineastas. Na década de 1920, homens como Buñuel buscavam novas amostragens e significados. Enfrentavam, em contrapartida, lançamentos tumultuados e até mesmo a proibição de filmes, como ocorreu com A Idade do Ouro. A perseguição pela estética diferenciada, por trabalhos que não mostrassem a mera utilização da forma convencional do cinema como divertimento, com o tempo encontrou artistas sempre dispostos a reforçar esse caminho. Sem homens como Ingmar Bergman, o cinema ainda viveria meramente no campo externo, de intenções pouco explicadas. Também não seria desgrudado do chamado "entretenimento", igualmente descrito como um filme ligado às fórmulas que o faziam se enquadrar a um gênero. Mas claro que havia exceções no período clássico, como Renoir, Pabst, Lang e Dreyer. Verdadeiros autores.

Com Bergman, o mergulho à alma, ao interior humano – frágil, complexo, desafiador –, tornou-se uma necessidade de exploração estética. Parece impossível representar em imagens a condição humana de muitos que choram em silêncio, que, como as crianças de Fanny e Alexander, pensam dialogar com os mortos e vêem o mundo de forma diferente dos personagens de Dickens do período clássico, aventureiras do "lado" externo, com explicações, ao fim, mais precisas. Com esse filme, do início dos anos 1980, Bergman retorna à estética grandiosa. Desfila, em seqüências, suntuosidade como poucas vezes se viu em sua obra. Não esqueceu, felizmente, os artifícios que antes o tornaram grande. A criança, para tentar resumir o que o cineasta deseja, é uma peça mais importante que o baile que a circunda, que as pessoas cujas intenções não entende por completo – mesmo sem esquecer que ambas as esferas não vivem separadamente. O castelo de sua imaginação é maior enquanto a composição física, de grande beleza, é menor às necessidades do texto. Assim, pode se diferenciar o cinema e as buscas de Bergman quando comparado ao Visconti dos anos 1960, quando a suntuosidade da imagem tinha um papel tão importante quanto os personagens que percorriam os ambientes. Não se trata de uma comparação entre tais mestres, cada um em sua cruzada de explorações artísticas.

Fanny e Alexander não é um resumo da obra de Bergman, um possível capítulo final. O cineasta, após esse filme, ainda continuou trabalhando e manteve uma relação com a arte no teatro e na televisão. Os palcos são velhos conhecidos do diretor. Já havia feito filmes sobre o tema, como Noites de Circo e O Rosto, e parte de sua formação e busca das intenções humanas, como se a representação fosse inerente, estão ligadas à dramaturgia. A lição de Bergman está próxima da lição de Fellini, apesar de ambos estarem distantes em suas amostragens, estilos e inclinações às formações de seus personagens; também distante dos dois está Buñuel, que, ao invés de enveredar pelas dúvidas religiosas, como o sueco, aderiu à crítica fervorosa, à devoção de que a religião poderia castrar ainda mais os já complicados homens em relação com o mundo. Com Fanny e Alexander, Bergman chama a atenção ao olhar infantil. Seu trabalho mais autobiográfico também concede demasiado espaço aos adultos, relacionados com as crianças em pé de igualdade quando devem discutir certos assuntos ou mesmo dividir a culpa por algo. As crianças de Bergman são lançadas à fogueira dos erros humanos, de pais e padrastos confiantes na falsa razão dos dogmas religiosas. Para o pequeno protagonista e sua irmã, dois caminhos são mostrados: o teatro e a religião ortodoxa. O problema é que, enquanto guiados pelos mais velhos, como marionetes em busca de uma fuga, não podem evocar suas escolhas facilmente.
O lado bom, o teatro, é fotografado pelo mestre Sven Nykvist com claridade, com formas e cores que levam o espectador a pensar em dias felizes. São momentos em que as crianças vivem tempos de harmonia com os mais velhos, em festas ligadas à exaltação da vida pelo teatro. Eis o lado otimista de Bergman – também sua salvação promovida pela arte –, que logo seria eclipsado pelos interessantes conflitos com início na morte do pai de Fanny e Alexander (interpretado por Allan Edwall). Referência óbvia é o fato de estar encenando Hamlet no momento em que começa a se sentir mal, logo depois levado para casa. Uma cena de extrema beleza e sensibilidade mostra Alexander (Bertil Guve) relutando em se aproximar do pai. A mão do homem prende-se à do filho, como se estivesse contida nessa ação a impossibilidade de fuga do espírito, que mais tarde retorna para conversar com as crianças. Bergman dialoga com seu passado, com Shakespeare e com a vida dedicada aos palcos. O outro lado do texto, uma espécie de inferno às crianças, começa quando a mãe dos pequenos protagonistas decide se casar. Interpretada Ewa Fröling, Emilie personifica a beleza ainda jovem de uma mulher envelhecida pelas amarguras impostas por escolhas erradas e mesmo pelo seu próprio destino. Como uma mulher do início do século XX, não resta a ela muitas escolhas. Casa-se com um bispo ultra-religioso – aparentemente uma personificação malévola do próprio pai de Bergman –, interpretado na medida por Jan Malmsjö, talvez a melhor surpresa do filme.

Presos numa espécie de masmorra, as crianças passam a ser educadas sob os códigos da religião impressa pelo poder maior: o homem que manda na casa, como em sua esposa – obrigada a subtrair todo seu histórico de vida passada e começar do zero – e nas criadas. Com a mudança dos personagens também chega, de forma inevitável, a mudança das cores. A fotografia de Nykvist fica ainda mais rica enquanto a luz tenta invadir a escuridão. Como em outros filmes de Bergman, as sombras estão expostas ora ao fundo, ora à frente, dando oportunidade para que a luz invada algumas lacunas que revelam os rostos. Cena que evidencia tais formas dá-se no momento em que Alexander, libertado das amarras do padrasto, sai durante a noite para ir ao banheiro na casa do judeu Isak Jacobi (Erland Josephson). Na caminhada, perde-se pelos cômodos e encontra algumas marionetes, assim como, novamente, a imagem do pai. As sombras e a pouca revelação da vida, mesclada à face de desespero do jovem que acredita estar em contato com Deus (uma marionete de barba branca), é um dos pontos altos do filme. Depois, Alexander encontra dois rapazes que moram com Isak. Um deles vive preso em um cômodo. Em poucos minutos com o protagonista, narra, como se conseguisse prever, o destino do malvado bispo.

A obra de Bergman traz à mente um homem sereno e em silêncio no set de filmagem. Vê-lo dirigir os atores em Fanny e Alexander surge como uma surpresa. Em ação, seja na escolha dos enquadramentos, da composição e em conversas com seu parceiro Nykvist, Bergman mostrava grande vibração. Era como se pudesse fazer, àquela altura, o que bem desejasse, com a estatura de um verdadeiro mestre sem medo de errar ou de ser reprovado. Traz em cena também vários colaboradores do passado, como Josephson, Gunnar Björnstrand e Harriet Andersson, como Justina, uma das sinistras criadas do bispo. Também em cena estão atores que mais tarde fariam carreira de sucesso, como Lena Olin, que antes já havia feito uma pequena ponta em Face a Face, de 1976.

A exemplo de outros mestres da sétima arte, Bergman ajudou a definir o sentido do cineasta como um autor. Antes mesmo da nouvelle vague estourar, Jean-Luc Godard, em um artigo publicado na revista Arts, em julho de 1958 (um ano antes de Acossado), faz elogios à reestréia de Monika e o Desejo nos cinemas parisienses – "O acontecimento cinematográfico do ano" – e a relação de amor da França com o sueco. Mas, diferente da maioria dos filmes de Bergman, Fanny e Alexander tem gente demais em cena e arquitetura visual suficiente para fazer a platéia se sentir em um filme de verdade, pois muitos trabalhos do cineasta – como os de Godard e Rohmer – são usualmente acusados de serem "artísticos" em excesso. Não por acaso, é considerada sua obra mais acessível, longe de seu máximo – esse sim um resumo de suas buscas e amostras – observado em Quando Duas Mulheres Pecam. O que atrai tanto no caso de Fanny e Alexander é a fatalidade da convivência entre o lado bom e o ruim, representados em diferentes usos de luz ao longo da caminhada do personagem Alexander, uma espécie de alter ego de Bergman. Nem mesmo sua mãe pode salvá-lo, ou Deus, de quem reclama em determinado momento. Em uma cena que beira o insuportável, o bispo tenta mover a consciência do jovem a pensar como ele, fazendo então da pequena mente um fragmento submisso e controlado. Mais do que dotado do poder de ver espíritos, o jovem, de acordo com o texto, depende de sua imaginação. Esse, segundo Bergman, é o milagre de ser criança. E a riqueza é ainda mais nítida quando se imagina que o cineasta trouxe suas lembranças para mostrar como a arte, e não os dogmas religiosos, salvaram sua vida.Cinema sem Tempo

FANNY E ALEXANDER:
"Fanny & Alexander" é um magnífico, empolgante e ambicioso filme sueco. Realizado pelo grande cineasta Ingmar Bergman, sua história acompanha os maus-tratos sofridos por duas crianças, Fanny e Alexander, principalmente este último, quando sua mãe viúva decide se casar com um bispo luterano que, agindo como um verdadeiro tirano, exige que ela deixe para trás sua casa, vestidos, jóias, bens, seus amigos, família, idéias, hábitos e tudo o mais que possa lembrar a vida que levava anteriormente.
Tendo recebido seis indicações ao Oscar, este filme sueco foi agraciado com nada menos quatro estatuetas, inclusive a do Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira.

A direção de Bergman é perfeita, mantendo um ritmo adequado a prender a atenção do espectador do início ao fim. O belo trabalho apresentado por Sven Nykvist, fotógrafo preferido do cineasta, assim como, o figurino assinado por Marik Vos, são dois outros quesitos que merecem destaques.

Como na maioria de seus filmes, os questionamentos religiosos acham-se também presentes em "Fanny & Alexander". Quando as crianças encontram-se na casa do judeu Isak Jacobi, num determinado momento, por exemplo, o questionamento de Alexander sobre a existência de Deus é extremamente pesado, que não ouso repeti-lo. Em seu universo, o cineasta cria espaços para cristãos e judeus, ricos e pobres, sãos e insanos, jovens e idosos, fantasmas e magia, além de uma galeria de personagens inesquecíveis por suas peculiaridades.

O filme basicamente se inicia e termina com a família reunida, em torno de uma mesa: no início, para comemorar a passagem do Natal e, no fim, para celebrar o batismo de duas crianças.



A Hora do Lobo
 por Tiago Lipka

A Hora do Lobo começa de maneira particularmente esquisita. Enquanto os créditos iniciam, o som da equipe de filmagem e de Ingmar Bergman dando instruções a equipe pode ser ouvido. Em seguida, Alma (Liv Ullmann) conversa com o público, confessando coisas que ainda veremos no segundo ato do filme. Única obra de terror que Bergman produziu, A Hora do Lobo é um pesadelo que vai ficando cada vez mais real conforme o filme passa. Lidando com alucinações de um personagem que sofre de insônia, Johan (Max Von Sydow), Bergman deixa de lado no início do segundo ato se o que vemos é real ou imaginação, aliás mais do que isso: quando ouvimos o diretor gritar "Ação" no início, Bergman já deixou claro que o filme, era só isso, um filme. Portanto por mais que vejamos os personagens vivendo sua realidade, para o público, nada daquilo é real.
Mas o belo roteiro de Bergman nos coloca lado a lado com Alma, e é através dela que acompanhamos a história do filme. Alma e Johan são um casal que, fugindo de uma crise de Johan viajam a uma ilha pacífica. Porém, os habitantes da ilha começam a visitar Johan com cada vez mais frequência, e suas características peculiares vão assustando cada vez mais o casal.
A fotografia do filme é maravilhosa e a trilha sonora é um show a parte. Agressiva e perturbadora, é a música que evoca o clima de terror que Bergman planejara. E por falar no diretor, seu trabalho nesse filme é explêndido, e o melhor até hoje que já conferi: o início do filme se revela estático e com longos planos mostrando diálogos sem cortes, no segundo ato é substituída por uma câmera nervosa (em especial a cena do jantar no castelo). Além disso, o diretor cria algumas das imagens mais perturbadoras de seus filmes, como o garoto morto que flutua no mar, ou os donos do castelo rindo enquanto Johan está com sua amante.

Em se tratando de Ingmar Bergman, já sabemos que o filme é um verdadeiro tijolo, ou seja é parado, cheio de pausas e silêncio que se acumulam e fazem a maioria das pessoas achar chato. Porém, no caso desse filme, a crescente tensão e as surpresas que seus personagens acabam revelando prendem a atenção do espectador (e acredito que seja o filme mais "acessível" que já vi de Bergman).
E ao final, resta apenas uma pergunta: Seríamos nós, o público, os fantasmas de Alma?


 
O Silêncio

Por Demetrius Caesar 
Não apenas um filme, reflete todo o pensamento de uma geração.

Duas irmãs estão no exterior a caminho de casa. Elas talvez mantenham uma relação incestuosa lésbica. Uma delas é tradutora e se embebeda diariamente para tentar suportar as dores de uma doença maligna que a destrói por dentro. A outra irmã, mãe de um garoto, aproveita as tardes quentes do verão russo para visitar bordéis e satisfazer seus desejos neuróticos de dominação e submissão.

Para falar de O Silêncio, de Ingmar Bergman, derradeira parte de sua “Trilogia do Silêncio”, é bom voltar ao ano de 1964, quando os estudantes atearam fogo em Paris. Só durou duas semanas o qüiproquó, mas os reflexos, como todos sabemos, foram muitos e duradouros. Já teria valido a pena só por ter dado assunto a tantos ótimos filmes. Talvez outro ótimo reflexo foi ter impedido a premiação do Festival de Cannes daquele ano – é brincadeira.

O ano 1964 entraria para a história de qualquer forma, pois foi a o ano de Bande à Part (Jean-Luc Godard), Gertrud (Carl Dreyer), Marnie, Confissões de uma Ladra (Alfred Hitchcock), Uma Mulher Casada (Jean-Luc Godard), O Esporte Favorito dos Homens (Howard Hawks), Deserto Vermelho (Michelangelo Antonioni), A Terra do Sonho Distante (Elia Kazan), O Silêncio (olha ele aí!) e Para Não Falar de Todas Essas Mulheres (ambos de Ingmar Bergman), além de O Criado  (Joseph Losey, para muitos, a sua obra-prima). Essa é, pela ordem, a lista dos dez melhores filmes do ano feita pela revista francesa Cahiers du Cinéma, então a maior referência cinematográfica mundial.

Mas havia muito mais: Os Guarda-Chuvas do Amor (Jacques Demy), Um só Pecado (François Truffaut), Caravana de Bravos (John Ford), Dr. Fantástico (Stanley Kubrick), Minha Bela Dama (George Cukor, que venceu o Oscar), Diário de uma Camareira (Luis Buñuel na França), o magnífico A Mulher de Areia (Hiroshi Teshigahara), Crepúsculo de uma Raça (John Ford) e até Os Reis do Iê-Iê-Iê (Richard Lester). E olha que só usei a Cahiers de fonte, tem muito mais.

Pois O Silêncio foi eleito o oitavo melhor filme do ano com concorrência pesada, inclusive o diretor, pois o próprio Bergman entrou no duro páreo com outro de seus filmes, Para Não Falar de Todas Essas Mulheres. O cineasta sueco estava no auge do prestígio, já havia ganhado Cannes e o Oscar (esse, duas vezes), gozava de fama internacional (os cinéfilos brasileiros devoravam seus filmes com fervor quase religioso, um paradoxo) e garantido seu nome na história.

Bergman desenvolveria tema semelhante, do embate entre mulheres que psicologicamente se imiscuem, com insuperável maestria no seu filme seguinte, Persona (66), ou mesmo numa de suas obras-primas, Gritos e Sussuros (73). Bergman repetia os temas, mas são as variações deles que realmente importam. Em O Silêncio, é impossível saber qual das irmãs é projeção da outra, qual seria a verdadeira ou quem é o ego liberado da primeira, se a reprimida intelectual ou a liberada fútil. No duelo verbal, confrontadas, ambas se aniquilam. Cada uma quer ser uma parte da outra, têm inveja, mas não suportam as limitações.

Em resumo, falar de O Silêncio é, portanto, falar de um tempo mítico em que o cinema não era uma diversão, mas a legítima representação artística do que pensava, ansiava e esperava toda uma geração. O ideal marxista de 64 provou-se inviável e foi suplantado pela democracia capitalista. Os filmes, porém, resistiram ao tempo. O Silêncio tem os excessos da época e não supera as duas primeiras partes da “Trilogia do Silêncio”: Através de um Espelho e Luz de Inverno. No entanto, não há espaço hoje para esse tipo de filme; não são mais feitos. Eles são, como o ideário daquela época, apenas utopia.